Ao rejeitar a cassação de Natan Donadon, Câmara sinaliza que pretende manter o mandato dos quatro deputados condenados no mensalão.
Pedro Ladeira/Folhapress
Natan Donadon (de terno preto) deixou a Câmara dos Deputados “absolvido” pelos colegas, mas algemado e escoltado por policiais. Foi direto para um camburão, que o levou para o Presídio da Papuda, onde cumpre pena por desvio de dinheiro público
Durante a primeira fase do julgamento do mensalão, no ano passado, foram condenados pelo STF os deputados João Paulo Cunha (PT-SP), José Genoino (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT). Dos quatro, apenas Cunha vai cumprir a pena de 9 anos e 4 meses de prisão em regime fechado, enquanto os demais serão punidos em regime semiaberto. Na Câmara, os processos de cassação contra todos eles só devem ser abertos após a conclusão do julgamento dos recursos pelo Supremo.
“Não tenho dúvida de que o que aconteceu com o Donadon é uma prévia do que muitos deputados planejam para os mensaleiros. Mas não foi só essa votação, começou bem antes”, diz o deputado paranaense Sandro Alex (PPS). No dia 21, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovou o parecer pela cassação de Donadon, mas rejeitou o entendimento de que a perda de mandato poderia ser decidida de forma imediata pela Mesa Diretora da Câmara, sem precisar ser submetida ao plenário. Sandro Alex esteve entre os 16 parlamentares que se colocaram a favor dessa interpretação na CCJ, mas acabaram vencidos.
Leitura própria
Ontem, o ministro do STF Marco Aurélio Mello avaliou que a Casa fez uma “leitura muito própria da Constituição” ao levar a decisão ao plenário. Em 2012, o Supremo definiu que a condenação criminal de deputados implicava em perda automática de mandatos. A interpretação foi revertida em 2013 devido ao posicionamento de dois novos ministros do STF, Teori Zavascki e Luís Roberto Barroso. E o Congresso voltou a ter prerrogativa sobre as cassações.
Como uma nova “resposta” à polêmica, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), anunciou que colocaria ontem na pauta uma PEC que restabelece a perda automática do mandato de condenados, em sentença definitiva, por improbidade administrativa. Depois de ser aprovada pelos senadores em dois turnos, a proposta ainda precisa passar pela Câmara. “É indiscutível que nos encontramos em um labirinto jurídico. Presidiário não se conjuga com mandatário do povo”, justificou.
Mesmo sem ter bancado anteriormente a cassação de Donadon sem a necessidade de votação secreta em plenário, o presidente da Câmara manteve a suspensão do deputado, que havia deixado de receber salário em julho. Ele também convocou o suplente, Amir Lando (PMDB-RO), que assumiu ontem a vaga de Donadon.
5 paranaenses não votaram; posição dos demais é secreta
Euclides Lucas Garcia
Dos 30 deputados federais do Paraná, cinco não votaram no processo que livrou Natan Donadon da cassação do mandato. Eles se somaram a outros 103 parlamentares que, justamente no dia de maior quórum na Casa, não estavam presentes no momento da votação. O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), chegou a deixar o painel aberto por duas horas e meia na esperança de aumentar a presença de deputados. Mesmo assim, faltaram 24 votos para cassar Donadon.
André Zacharow (PMDB), Angelo Vanhoni (PT), Nelson Padovani (PSC) e Eduardo Sciarra (PSD) tinham presença registrada em painel, mas deixaram de votar. Todos alegaram que tinham compromissos agendados previamente e precisaram deixar Brasília antes que a votação fosse iniciada.
Zacharow disse ter aguardado em plenário até as 19 horas, quando precisou se ausentar para cumprir agenda no Paraná. Vanhoni afirmou que antecipou o retorno ao estado para participar de um debate sobre educação, na condição de relator do projeto que trata da política nacional sobre os Recursos Educacionais Abertos. Padovani justificou que precisou retornar ao Paraná, como relator da subcomissão de Endividamento Rural, para visitar 15 municípios produtores de café atingidos pelas geadas das últimas semanas. Já Sciarra informou que embarcou às 18h50 para São Paulo, onde tinha compromissos agendados com antecedência.
Dos quatro parlamentares, três disseram que votariam pela cassação do mandato de Donadon. Apenas Zacharow declarou que não tinha uma definição do voto e iria ouvir o discurso do parlamentar de Rondônia para se posicionar. “Não tinha um relacionamento próximo com ele, e só conhecia o caso pelos jornais. Gostaria de ouvi-lo antes para tomar uma decisão justa”, argumentou o peemedebista.
O único paranaense faltante foi Abelardo Lupion (DEM). Ele, que disse defender a cassação de Donadon, afirmou que estava no Paraná acompanhando uma missão israelense em visita ao estado. “Foi [um resultado] lamentável. A Câmara deu um tiro no pé. [A votação] foi mal organizada, não avisaram antecipadamente que seria nesta semana.”
Não é possível saber como se posicionaram os demais 25 deputados do Paraná, pois o voto de processos de cassação é secreto.
Discurso sobre drama e independência sensibilizou colegas
O deputado federal Natan Donadon reforçou dois argumentos com forte apelo entre os colegas no discurso em defesa da manutenção do mandato: o drama de enfrentar o sistema penitenciário brasileiro e a independência do Legislativo em relação ao Judiciário. “Cada palavra que ele falava era como um espelho para a maioria dos deputados, que morrem de medo que aconteça o mesmo com eles”, descreveu o coordenador da bancada paranaense, Marcelo Almeida (PMDB). Para ele, a concessão de mais tempo foi fundamental para Donadon “emocionar” os colegas – pelo regimento, ele teria 25 minutos, que se estenderam a 40 graças aos gritos de “deixa ele falar” de vários companheiros.
Antes de subir à tribuna, o parlamentar, que está detido no Presídio da Papuda, em Brasília, desde 28 de junho, percorreu o plenário mostrando aos colegas as marcas de algemas nos pulsos. No começo da fala, relatou as agruras da prisão. “Lá não há chuveiro, é uma torneira de água fria, e justamente hoje faltou água. Estava todo ensaboado e tive que recorrer a um preso do lado da minha cela, que tinha umas garrafinhas”, afirmou.
Nascido em Porecatu, na região norte do Paraná, Donadon começou a carreira política nos anos 1990, em Rondônia. O parlamentar foi condenado pelo STF a 13 anos de prisão pelo desvio de R$ 8,4 milhões da Assembleia Legislativa de Rondônia, quando foi diretor financeiro da instituição. A decisão do STF ocorreu em novembro de 2010, mas a análise de recursos durou quase três anos.
Sobre os motivos que levaram à condenação, Donadon atacou a imprensa. “Lamento muito a mída nacional, grande parte dela, ser sensacionalista e irresponsável. A verdade nem sempre dá notícia.” Ao final, pediu ajuda para “restabelecer a verdade” e frisou: “Esta Casa é independente”, reforçando a tese de que o Congresso não precisaria se submeter ao STF.
Fim do segredo
Decisão tende a impulsionar aprovação da PEC do voto aberto
A reação das principais lideranças partidárias no dia seguinte à sessão que manteve o mandato de Natan Donadon foi tentar acelerar a tramitação da PEC 196/2012, de autoria do senador paranaense Alvaro Dias (PSDB), que acaba com o voto secreto para cassações. A proposta já foi aprovada pelo Senado e tramita em comissão especial da Câmara. “A aprovação imediata do voto aberto será uma maneira de pedir desculpas à população pelo episódio”, disse Ronaldo Caiado (DEM-GO). O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), defendeu a sugestão de Alvaro e afirmou que “enquanto for presidente” não vai levar à votação secreta novos processos de cassação. Alves permanece no cargo até fevereiro de 2015.
13 anos de prisão é a pena que Natan Donadon terá de cumprir, segundo sentença do STF. Ele foi condenado pelo desvio de R$ 8,4 milhões da Assembleia de Rondônia.
Fonte: Jornal Gazeta do Povo
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