Detento reclamou da superlotação da carceragem, que tinha 149 presos onde caberiam apenas 24; polícia diz que é difícil controlar entrada de celulares.
A conversa foi inusitada: de dentro do 5º Distrito Policial, zona norte, um preso ligou de celular, na manhã de ontem, para a rádio Paiquerê AM e denunciou ao apresentador Carlos Camargo, ao vivo, a crítica superlotação da carceragem.
Na conversa de pouco mais de três minutos com o apresentador, o detento, que se identificou como Cléber, pediu “socorro” às autoridades de segurança da cidade e contou que os próprios detentos impediram a entrada de novos homens na carceragem superlotada.
Ontem, segundo a Polícia Civil, 149 presos estavam onde caberiam apenas 24 – em seis celas. “‘Tá’ impossível ficar aqui dentro. Uma cadeia para 35 detentos e tem mais de 130. Tem suspeita de tuberculose aqui dentro”, contou o preso, em entrevista pelo telefone. Segundo Cleber, dos seis banheiros das celas só dois estavam funcionando. O detento também reclamou que as visitas de familiares foram cortadas e afirmou que todos estavam proibidos de receber alimentos de fora – a “jumbada”, no jargão da cadeia.
É a segunda ou terceira vez que isso acontece”, diz o produtor do programa, Valmir Martins, jornalista que atendeu ao telefonema. “Ele ligou na produção, falou que precisava de ajuda e que estava dentro do 5º Distrito. É um absurdo ter celular dentro da cadeia. Mas como não levar ao ar alguém que está em uma situação dessas?”, diz o jornalista. Antes de a ligação ir ao vivo, Martins explica que os presos se reuniram e combinaram quem falaria. “Como eles conseguem esses créditos para ligar é o problema. Com certeza passam o dia em golpes usando o próprio celular.”
Segundo a Lei de Execuções Penais, o uso de celular dentro do sistema carcerário é considerado como falta grave e pode levar o preso a perde benefícios, como a progressão para o regime semiaberto, por exemplo.
Após a denúncia ir ao ar, o juiz da Vara de Execuções Penais (VEP), Katsujo Nakadomari, determinou a remoção de 10 presos para a Penitenciária Estadual de Londrina 2 (PEL), movimentação que aconteceria entre ontem e hoje, com suporte do Departamento Penitenciário (Depen).
Difícil controle
“Esse negócio de preso no celular é complicado”, lamenta o delegado chefe da Polícia Civil, Márcio Amaro. “A revista não pega tudo porque não temos estrutura de presídio para checagem”, afirma.
Segundo ele, os presos recebem celulares de várias formas: “Jogam através do muro, pela grade, entram na parte íntima de mulheres”, enumera. “Infelizmente acontece”. O delegado pediu para hoje suporte da Polícia Militar para um pente-fino nas celas. No mês passado, um dos presos do 5° DP, Welington Carlos Barbosa, 19, publicou no Facebook uma foto tirada de dentro da cela.
Sobre a superlotação, Amaro esperava que as 10 remoções de presos para a PEL surtiriam um efeito “apenas momentâneo”. De acordo com o delegado-chefe, os presos permanecem soltos nos corredores entre as seis celas no 5º DP e “se viram como podem”.
O chefe da Polícia Civil de Londrina confirmou um princípio de tumulto ontem, quando os presos se rebelaram para impedir a entrada de dois novos detidos e reconhece as péssimas condições estruturais da cadeia. Sustenta, no entanto, que a Polícia Civil “deixa tudo nas mínimas condições para receber os presos”.
Confira os principais trechos do diálogo entre o preso e o apresentador da rádio Paiquerê AM
Carlos Camargo - Cleber, bom dia! Fala de onde?Detento - Ô Camargo, falo do 5º DP. Falo pela voz da cadeia e me escolheram para falar com você. Tá impossível ficar aqui dentro, uma cadeia com 35 detentos e tem mais de 130 detentos. Tem suspeita de tuberculose aqui dentro. E são seis ‘boi’, mas só dois tão ativado (sic). Camargo - Boi é banheiro? Detento - É. Os outros estão tudo entupido. A gente estamos sendo oprimidos porque o plantão só sabe abrir a portinhola e jogar preso para dentro. Tem ladrão aqui que já podia estar no direito do semiaberto, gente com cadeia paga.
Camargo - E vocês tão querendo fazer o quê? Detento - A gente quer uma melhoria. Que os recursos humanos (sic) venham ver nossa situação aqui, entendeu? Estamos sem visita e sem pátio, porque na cadeia lotada os presos tentam fugir mesmo. Deixaram a gente sem visita, sem jumbada, com gente doente aqui. A gente quer uma posição das autoridades, entendeu?
Camargo - Vocês estão em 140 presos onde cabem 35? Detento - Sim, em 140 aqui. Em pleno domingo entrou mais quatro, hoje entrou mais dois que não deixamos e tão (sic) no quadrante do lado de fora. Então, os que ficaram aqui querem pagar cadeia e o erro que cometeu. Mas nessa situação não dá, não tem ninguém para socorrer a gente nessa questão da superlotação.
Camargo - A superlotação é o principal incômodo de vocês? Detento - É. Dormir em (inaudível) apertado, tem até senhor de idade, rapaz. Entendeu?
Camargo - E os presos estão quietinhos, por enquanto não se rebelaram nem nada. O que vocês querem é que as autoridades acordem para o que vocês estão vivendo, certo? Detento - Entramos em contato primeiro com você para ver se tem um parecer hoje. Essa cadeia tem que esvaziar. Se não tiver como esvaziar... a cadeia está de boa, não tem briga, está pacífica. A partir do momento que não tiver um parecer vamos começar a partir para o outro lado.
Fonte: Jornal de Londrina
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