segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Do balé ao comando da Polícia Militar.

Tenente-coronel Karin Denise Krasinski, 43 anos, Comandante do 20º Batalhão da Polícia Militar do Paraná.

                                                                      Aniele Nascimento/Gazeta do Povo
                          Aniele Nascimento/Gazeta do Povo / “Passamos da época quando o estado determinava como e quando as coisas iam acontecer. Se eu não construir junto com a comunidade, eu não vou  ter a solução”
                                   “Passamos da época quando o estado determinava como e quando
                                    as coisas iam acontecer. Se eu não construir junto com a comunidade,
                                    eu não vou ter a solução”

No próximo dia 5, a tenente-coronel Karin Denise Krasinski, 43 anos, chega aos seis primeiros meses do mandato como comandante do 20.º Batalhão da Polícia Militar (PM), que toma conta de 29 bairros de Curitiba. Ela é a segunda mulher a assumir um cargo de comando na PM do Paraná. Para chegar a um dos cargos mais importantes da hierarquia da corporação, a tenente-coronel precisou fazer escolhas: bailarina na adolescência e caloura do curso de Medicina, a história familiar militar falou mais alto.

Para a mulher miúda, sensível, mas conhecida por sua postura firme e determinada diante de suas atribuições, assumir o comando, após 26 anos de carreira militar, é um desafio. Em quase três décadas de atuação policial, a tenente-coronel Karin se diz apaixonada pelo seu trabalho. Mas confessa que atualmente as dificuldades passam pelo reduzido efetivo e insuficiente número de viaturas, além da falta de um entendimento social da criminalidade.

O 20.º, batalhão que comanda, é um dos mais novos no estado e também um dos maiores da capital. As dificuldades surgem pela heterogeneidade da área abrangida: desde o bairro Alto Boqueirão, na região sul, passando pelo Bacacheri e Jardim Social, até o Cachoeira, no limite com Almi­­rante Tamandaré, na região metropolitana. Veja os principais trechos da entrevista com a comandante.

O que lhe motivou a entrar na Polícia Militar?
Como filha de policial militar, fui estudar no Colégio da Polícia Militar. Nasci nessa vida. O colégio acaba sedimentando os valores de carreira. Foi uma questão de oportunidade. Na época, os primeiros colocados tinham preferência de vaga. E eu tive a sorte. Há mais de 20 anos, o concurso para mulher era de vez em quando. Porém, o que me motivou mesmo, na época com 17 anos, foi a aptidão.

Quais foram as primeiras dificuldades?
A escolha entre o curso de Medicina e a carreira militar. Eu recém-tinha passado no curso de Medicina, em um concurso no exterior. Não havia incentivo por causa das dificuldades da profissão. A carreira militar é e continua sendo uma profissão masculinizada. Em uma família de quatro irmãs, só eu segui a carreira.

Houve preconceito no início?
Sim, por parte dos amigos e das pessoas com quem eu convivia. Eu era bailarina. Para muitos não casava a ideia de uma moça frágil – sou miúda – com a truculência e a brutalidade que algumas pessoas imaginavam, naquela época, existir na profissão.

E quando você sentiu-se uma policial militar?
Minha primeira experiência na carreira policial foi em um patrulhamento em São José dos Pinhais [na região metropolitana de Curitiba], durante um atendimento de acidente de trânsito. Ainda era estagiária. A vítima estava muito ferida – era uma senhorinha que acabou morrendo no local. Naquele momento, senti a autoridade, porque consegui evitar um confronto entre a comunidade e o causador do acidente. Essa é a grande satisfação do policial que faz o que gosta: a sociedade olha e diz “agora é com você”. Naquela hora, percebi que a farda tinha uma função social.

Como você vê a entrada de mulheres em posições até há alguns anos tipicamente masculinas?
A carreira militar ainda não atraiu a mulher pelas dificuldades físicas. De 484 policiais do 20.º, 14 são mulheres. Em todo o Paraná, não temos mais do que 5% de todo o efetivo, que ultrapassa 13 mil policiais militares, contando com o Corpo de Bombeiros.

Como é ser a comandante de uma companhia que agrega bairros com criminalidade alta?
No decorrer da carreira, vamos treinando para o comando. Como eu gosto da filosofia de policiamento comunitário, sempre investi meus esforços e conhecimentos nessa área. Dessa forma, norteio o meu trabalho com a aproximação aos Conselhos de Segurança [Consegs] e à comunidade. A área do 20.º é gigantesca – passa por favela e por bairros de classe média. Gosto de trabalhar com comunidades fragilizadas socialmente porque tenho de entender porque o criminoso sai daqui e vai até o Jardim Social cometer o crime.

Como é a sua postura no dia a dia?
Sou “Caxias” por natureza. Sou firme e sigo os regulamentos. Mas, em contrapartida, em casos que necessitam de um apoio, sento com o policial para conversar. Não mando recado. Eu mesmo dou.

Quais são os principais desafios atualmente?
Melhorar os índices de criminalidade. O que me angustia é o fato de saber que tenho 11 viaturas para cobrir 29 bairros. Eu não sei mais que criatividade usar para colocar mais policiamento na rua. Ficamos felizes com as novas contratações. A renovação da frota também está sendo discutida. O grande desafio é fazer muito pirão com pouca farinha [risos].

O que pretende fazer para mudar essa situação?
A meta é colocar uma viatura por bairro ou com 5 mil metros quadrados por região. Tem bairros que, pelo nível de ocorrência, eu não consigo fazer a prevenção, nem visitas. Fico somente atendendo ocorrência.

O que você aprendeu no combate à criminalidade?
O que mais aprendi – e o que mais me angustia – é chegar a uma comunidade mais privilegiada – chego a perder a calma – e ouvir falar de uma comunidade menos privilegiada de forma desonrada, como se fossem “coisas”. Isso me agride profundamente. Eu aprendi a entender por que aquela pessoa agiu daquela forma [o criminoso] por mais que eu não aceite o fato.

Qual é o papel da polícia, neste momento?
A polícia é tudo para a comunidade. O 190 é a porta de entrada dos serviços que atendem desde o gato que está na árvore até o doente mental, que precisa de internamento. Para acabar com esse gargalo, é preciso construir uma rede. Das 45 mil ligações que recebemos mensalmente, 15 mil transformam-se em ocorrências e destas, somente 1,5 mil acabam sendo encaminhadas.

Quais as saídas para melhorar a segurança pública?
Conversar com a comunidade. Usamos os Consegs como porta, mas estamos planejando uma palestra em praça pública. Para mim, a campanha Paz Sem Voz é Medo, da Gazeta do Povo, está tendo um cunho de que a segurança não está somente na mão dos outros [no sentido de poder público]. Está nas mãos do cidadão que precisa denunciar.

E a sua rotina?
Na função de comando fico atenta 24 horas. Esta noite [quinta-feira, dia 15], o meu celular tocou quatro vezes durante a madrugada. Você não desliga nunca. A aceitação dessa rotina é mais fácil tendo um marido militar.

Como você é na vida privada?
Sou uma dona de casa. Cozinho, me interesso pela minha família. Atualmente, o pouco tempo que tenho fico com minhas duas filhas. Gosto de atividade física, mas não dá tempo. Amo dançar, mas larguei o balé um ano e meio após ingressar na escola militar. Na próxima encarnação, quero ser só bailarina.

Fonte: Jornal Gazeta do Povo

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