quarta-feira, 31 de agosto de 2011

“Pacotão” da Renault deve ser padrão para futuras negociações.

Sindicato dos metalúrgicos tentará aumentos semelhantes para a Volvo; analistas dizem que acordos de longa duração são sinal de amadurecimento.

                                                                    Daniel Castellano/ Gazeta do Povo
                       Daniel Castellano/ Gazeta do Povo / Linha de produção da Volvo na Cidade Industrial de Curitiba: negociações começaram ontem
                               Linha de produção da Volvo na Cidade Industrial de Curitiba:
                               negociações começaram ontem

O “pacote” de acordo salarial negociado entre os trabalhadores e a montadora Renault, com validade até 2013, servirá de base para outras negociações dos metalúrgicos e também deve pautar as negociações em outras categorias do setor automotivo e autopeças.

Ontem, o Sindicato dos Meta­lúrgicos da Grande Curitiba (SMC) iniciou negociações com a Volvo, instalada na Cidade Industrial de Curitiba (CIC). A expectativa do sindicato é fechar com a montadora um acordo nos mesmos moldes do acertado com a Renault, que garanta ganhos reais (acima da inflação) de 2,5% em 2011, 3% em 2012 e 3,5% em 2013, além de abonos salariais e participação nos lucros e resultados (PLR).

“O momento econômico que o país vive permite que as partes negociem acordos mais amplos. A ideia é que consigamos cumprir novos acordos nas mesmas condições”, afirma o presidente do SMC, Sérgio Butka. Segundo ele, o sindicato negocia individualmente com 150 empresas a cada seis meses (índice salarial e demais benefícios, em pautas individuais). “Os acordos, geralmente, são atropelados pelo tempo. É a primeira vez que o sindicato fecha uma negociação de longo prazo e essa condição amplia, amadurece a relação com as empresas. Poderemos discutir outros temas, como ampliação, manutenção, investimento e segurança. Temos de partir para uma discussão diferente para não ficar sempre tentando recuperar o prejuízo”, defende.

Novo patamar
O diretor-adjunto do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Unicamp, Anselmo Santos, aponta que acordos trabalhistas de dois ou três anos são comuns em países com economias estáveis e desenvolvidas, como Alemanha, Suécia e Dinamarca. “Esse tipo de acordo só e possível graças à estabilidade e à perspectiva de crescimento da economia nos próximos anos”, avalia.

Segundo Santos, o acordo fechado pela Renault representa um novo patamar de maturidade nas relações de trabalho, ajudando a diminuir as tensões e conflitos, além de demonstrar uma aposta – de trabalhadores e empresas – na continuidade do crescimento e na estabilidade econômica. “É um avanço importante, ainda mais considerando que são negociações com aumento real para os trabalhadores. A empresa mostra que tem capacidade de manter o crescimento nos próximos anos e de repassar ao trabalhador parte do ganho de produtividade”, afirma o especialista.

Planejamento
O economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) Sandro Silva ressalta que o acordo de longo prazo traz “previsibilidade” para patrões e empregados. “As empresas podem trabalhar com um planejamento de custos e o trabalhador tem a garantia de aumento na renda”, avalia. O Dieese calcula que apenas o acordo da Renault deva adicionar R$ 343 milhões à economia paranaense.

Cid Cordeiro, economista do Dieese, explica que tradicionalmente o acordo de montadoras, bancários e petroleiros norteia as demais negociações. “Em 2010, o acordo dos metalúrgicos do Paraná foi referência estadual e nacional. O acordo deste ano também passa a ser. Não quer dizer que todos os outros setores vão seguir os mesmos índices, mas é um precedente, mostra que é possível um acordo de longo prazo”, argumenta.

Negócio fechado
Veja os principais pontos do acordo firmado entre a Renault e o sindicato:

Reajuste salarial
Em 2011, haverá repasse do INPC mais 2,5% de reajuste. Em 2012, o aumento real (acima do INPC) sobe para 3% e, em 2013, para 3,5%.

Abono salarial
O valor será de R$ 5 mil em setembro deste ano. Em 2012, será de R$ 5 mil mais a variação do INPC (a estimativa do Dieese é de que essa soma resulte em R$ 5,5 mil). Em 2013, será o valor de 2012 mais o INPC (total de R$ 6 mil, segundo o Dieese).

Participação nos lucros
R$ 15 mil em 2012 e R$ 18 mil em 2013.

Contraponto
Para Fiep, acordo cria dificuldades

Fernando Jasper
O acordo que a Renault fechou com os metalúrgicos é uma “anomalia” e não corresponde à realidade das indústrias paranaenses. A avaliação é do coordenador do Conselho Temático de Relações do Trabalho da Federação das Indústrias do Paraná (Fiep), Marcelo Ivan Melek. Segundo ele, os empresários têm motivos para temer que o pacote negociado pela montadora seja usado como ferramenta de pressão sobre as demais empresas e fornecedores da indústria automotiva e até de outros segmentos, que podem não ter condições de conceder benefícios semelhantes.

“As indústrias dos 99 segmentos filiados à Fiep não trabalham com a expectativa de acordos desse tipo. As negociações realizadas entre janeiro e agosto resultaram em ganhos reais de 1,5% em média [abaixo do concedido pela Renault]. E a maioria das empresas não trabalha com valor fixo de PLR, como fez a montadora, mas com um porcentual do salário”, diz.

Para o representante da Fiep, as negociações tendem a ficar mais difíceis de agora em diante. “Por mais que cada empresa e cada setor tenha seu próprio contexto, o acordo da Renault acaba virando paradigma. Aumenta a própria pressão do trabalhador sobre o presidente de seu sindicato”, admite.

Melek ressalta que, apesar dos expressivos ganhos recentes, as próximas negociações terão de levar em conta a crise internacional. “O próprio governo reconhece que o Brasil deverá ser afetado”, diz.

Fonte: Jornal Gazeta do Povo

Nenhum comentário: